quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

BULLYING: REPRESENTAÇÃO DA VIOLÊNCIA NO COTIDIANO ESCOLAR

BULLYING: REPRESENTAÇÃO DA VIOLÊNCIA NO COTIDIANO ESCOLAR
Ari Mourão
Valnice Machado
Thiago Moreira Spíndola
Joana Gláucia dos Santos
Resumo
A prática do Bullying nas escolas é talvez hoje uma das principais formas de manifestação de violência no ambiente escolar. As principais ações de Bullying vão desde a discriminação e colocação de apelidos até a humilhação e utilização de violência física. Os alvos preferidos por quem pratica o Bullying são os alunos que apresentam características físicas diferentes do restante do grupo. No contexto da escola, pode-se perceber a violência a partir do próprio aspecto físico do prédio escolar, com a existência de muros altos e grades que prendem crianças e adolescentes em seu interior, sem lhes oferecer uma proposta de ensino atrativa, dando um aspecto repressor à educação. A sociedade de modo geral, especialmente os próprios estudantes, preocupados com a construção da própria cidadania, vem exigindo da escola uma tomada de posicionamento diante da questão no sentido de propiciar uma solução para a questão. O Bullying é um fenômeno cada vez mais evidente no meio escolar atingindo todas as classes e níveis sociais. Dessa forma, é preciso que todos estejam atentos aos comportamentos dos estudantes no sentido de detectar situações que envolvam tal fenômeno. É preciso promover a conscientização de professores, pais e alunos no sentido de que todos se unam no combate ao Bullying de forma a reparar os danos físicos e psicológicos causados pelos agressores aos agredidos, principalmente por meio da prevenção. O ideal parece ser desenvolver uma estratégia de intervenção pautada no diálogo, dessa forma, as relações interpessoais se desenvolverão no âmbito da escola sem traumas, e com possibilidades de intermediação de conflitos sem que ocorra violência entre os alunos.
Palavras-chave: Bullying, violência e contexto escolar.


Introdução
Nos últimos anos, a mídia vem dando ênfase à inúmeros atos de violência que ocorrem dentro de ambientes escolares por todo o país, e pelo mundo de um modo geral. São inúmeros casos, em que alunos sofrem ou praticam agressões físicas e morais dentro da escola, fatos que por vezes se prolongam durante longos períodos.
Esses e outros fatos, que talvez possam parecer de pouca gravidade se vistos isoladamente, acabam tomando proporções alarmantes se vistos em conjunto, e por isso merecem atenção por parte de estudiosos e profissionais da educação, de forma a se desenvolver um debate a cerca da questão da violência nas escolas, especialmente o Bullying, que afeta sobremaneira o processo de ensino e aprendizagem.
Tendo por base essa necessidade vigente de uma profunda discussão a cerca dessas questões, justifica-se a realização deste trabalho, na medida em que o Bullying tem se tornado presença cada vez mais constante, principalmente nas escolas públicas. É preciso identificar, por meio de experiências concretas e de um embasamento teórico a complexidade da situação, em vista que tanto as origens, quanto as consequências desse novo fenômeno pode estar associado a inúmeros fatores que vão desde o ambiente escolar quanto familiar e social ou ainda à questões subjetivas, inerentes ao indivíduo no que se refere à formação de valores.
O objetivo geral desse trabalho é realizar uma análise qualitativa dos diversos aspectos que envolvem a questão do fenômeno Bullying nas escolas, abordando tanto seus aspectos morais quanto suas razões sociais. A análise de situações e episódios de desrespeito e agressividade dentro e fora do ambiente escolar permitirá a compreensão do Bullying como fator intrínseco a ser combatido dentro do sistema de ensino. Permitindo a investigação das causas e principalmente possibilitando a apresentação de propostas de trabalho voltadas para a solução da questão no sentido de equacionar os efeitos dessa interferência negativa da sociedade no ambiente escolar.
2 O que é o bullying
O termo Bullying pode ser definido como sendo um conjunto de atitudes e comportamentos intencionais e agressivos entre estudantes, que ocorrem repetidas vezes sem motivo aparente. Esses comportamentos por vezes são tratados dentro das escolas como fatos isolados e normais, não sendo tratados com o devido valor.
Em geral, o Bullying está associado à violência nas escolas, manifestando-se como demonstração de poder e força de um determinado estudante ou grupo de estudantes contra alguém que estes consideram inferior, seja por qualquer “motivo” que julguem relevante. Nesse sentido, os alunos “mais fortes” necessitam impor essa sua força por meio de agressão física e moral aos mais frágeis.
Segundo Lopes Neto (2005, p. 5):
A adoção universal do termo Bullying foi decorrente da dificuldade em traduzi-lo para diversas línguas. Durante a realização da Conferência Internacional Online School Bullying and Violence, de maio a junho de 2005, ficou caracterizado que o amplo conceito dado à palavra Bullying dificulta a identificação de um termo nativo correspondente em países como Alemanha, França, Espanha, Portugal, Brasil, entre outros.


Mas apesar da definição e até mesmo dos estudos a cerca do tema serem recentes, o Bullying é um fenômeno que está presente na realidade das escolas há bastante tempo, muito embora todos saibamos que o ambiente escolar tem se esforçado ao longo do tempo para combater atos de violência e indisciplina.
A prática do Bullying nas escolas é talvez hoje uma das principais formas de manifestação de violência no ambiente escolar. O Bullying se caracteriza pela ação agressiva e intencional contra um indivíduo ou grupo de indivíduos, acentuando características individuais desses indivíduos, atribuindo-lhes caráter pejorativo. As principais ações de Bullying vão desde a discriminação e colocação de apelidos até a humilhação e utilização de violência física.
Mas, além da definição apresentada, vale ressaltar os tipos de Bullying, de acordo com a manifestação de violência envolvida dos eventos, podendo dessa forma ser classificado como Bullying direto, quando existe uma agressão direta, seja ela verbal ou física, como por exemplo, o uso de apelidos pejorativos, ameaças, ataques gestuais ou espancamentos; Bullying indireto, quando a agressão se dá através de difamação, isolamento ou indiferença; e, há ainda o ciyberbullying que ocorre quando o Bullying se manifesta por meios tecnológicos, como por exemplo através do uso de mensagens eletrônicas, email’s ou telefonemas.
Segundo a ABRAPIA (Associação Brasileira de Proteção à Infância e Adolescência), o Bullying pode ser identificado a partir de algumas ações específicas, tais como: a adoção de apelidos, ofensas, zoações, humilhações, domínio, assédio, aterrorizamento, ameaças, roubos e quebras de objetos pessoais.
Quanto à esses fatores Antunes e Zuin (2008, p. 5) afirmam que:
O Bullying, tal como conceituado, não é uma simples manifestação da violência sem qualquer fator determinante. Na verdade, o Bullying se aproxima do conceito de preconceito, principalmente quando se reflete sobre fatores sociais que determinam os grupos-alvo, e sobre os indicativos da função psíquica para aqueles considerados como agressores.


Os alvos preferidos por quem pratica o Bullying são os alunos que apresentam características físicas diferentes do restante do grupo. Esses estudantes, em geral, têm medo de denunciar as agressões sofridas e acabam se afastando da escola e tendo assim, seu rendimento comprometido.
Outro fator que se desenvolve de forma acentuada nas vítimas do Bullying é a baixa auto estima, além da pouca sociabilidade e insegurança. O combate ao Bullying deve ter um caráter preventivo, dessa forma, o professor precisa estar atento aos primeiros sintomas desse acontecimento, de maneira a oferecer a devida intervenção antes do agravamento das atitudes e situações discriminatórias.

3 Manifestações de violência no ambiente escolar
A escola, segundo Schilling (2004), é um lugar de reprodução de desigualdades sociais, relacionadas à diversos aspectos como raça, etnia, gênero e pobreza. Sendo assim, a escola é uma potencial reprodutora da violência socioeconômica que aflige a sociedade como um todo. Mas ela é também um lugar de superação dessas desigualdades, e, assim, deve pautar seu trabalho na construção da cidadania também pela superação da indisciplina e da violência.
A escola historicamente apresenta reflexos da vida real, nesse sentido não é possível ignorar todas as questões que a cercam. São os próprios alunos que picham as escolas, que agridem os colegas, e até mesmo proferem ofensas contra os professores. Ao mesmo tempo, existem também professores que gritam com os alunos ou que batem boca com os pais na entrada da escola.
No contexto da escola, pode-se perceber a violência a partir do próprio aspecto físico do prédio escolar, com a existência de muros altos e grades que prendem crianças e adolescentes em seu interior, sem lhes oferecer uma proposta de ensino atrativa, dando um aspecto repressor à educação. Daí, como forma de reação contra essa violência que sofrem, esses alunos fogem indiscriminadamente, riscam as mesas, picham as paredes, danificam os banheiros, esmurram as portas, quebram os vidros das janelas, e etc.
Contra os colegas, também acontecem inúmeros atos de violência, como roubo de materiais, esbarrões pelos corredores, troca de xingamentos e palavrões que são proferidos aleatoriamente, discussões e bate-bocas em tons alterados que geram estardalhaços e aglomeração de pessoas; até que se chegue às vias de fato, com agressões físicas entre alunos, que depois voltam a se “pegar lá fora” dando continuidade à confusão, ou por vezes agravando a situação com o envolvimento de pessoas estranhas ou até mesmo de familiares.
A escola precisa estar atenta ao desenvolvimento de valores como respeito, tolerância e solidariedade, no sentido de possibilitar e trabalhar a valorização da vida tema de abordagem tão necessária e primordial no meio escolar. A sociedade de modo geral, especialmente os próprios estudantes, preocupados com a construção da própria cidadania, vem exigindo da escola uma tomada de posicionamento diante da questão no sentido de propiciar uma solução para a questão.
Pode-se considerar que violência e indisciplina são conceitos subjetivos. Entretanto, apesar dessa característica de subjetividade, não se pode negar que elas existam e que interfiram de forma significativa no processo de formação escolar.
Uma das manifestações mais evidentes do Bullying no ambiente escolar é a atribuição de apelidos, que segundo Schelb (2004, p. 12) é um tema de grande importância. Ele afirma que:
Crianças e adolescentes têm habito de apelidar com nomes peculiares os amigos e colegas. Embora, na maioria das vezes, esse fato seja até saudável, em muitos outros, porém, pode gerar traumas psicológicos, causando constrangimento e profunda revolta na vítima, especialmente de a razão do apelido é uma deficiência física, diferenças étnicas ou características peculiares da pessoa, por exemplo. Como conseqüência, a criança ou adolescente apelidado de forma depreciativa pode se desestimular dos estudos, abandonar a escola, ou ainda adotar comportamento agressivo.


É preciso que os professores, ou outros profissionais envolvidos no processo educacional estejam atentos para essas situações, evitando que esses apelidos, atribuídos aos colegas contenham caráter de constrangimento e humilhação. Isso só é possível por meio de intervenções que impeçam a construção de situações de risco que gerem violência. É preciso também estimular o desenvolvimento pessoal e a promoção de mecanismos de defesa que evitem situações de violência e agressão.
4 O combate ao bullying e a violência escolar
O Bullying é um fenômeno cada vez mais evidente no meio escolar atingindo todas as classes e níveis sociais. Nesse sentido, fatos podem ocorrem a todo instante, e podem ter inúmeros fatores que vão desde aspecto culturais e econômicos à fatores sociais e familiares. É preciso estar atento ao comportamento com o objetivo de identificar situações em que a agressividade possa aflorar.
O Bullying se caracteriza por ações continuadas dos agressores contra suas vítimas, ou seja, não se limitam a apenas uma agressão. Dessa forma, é preciso que todos estejam atentos aos comportamentos dos estudantes no sentido de detectar situações que envolvam tal fenômeno. É preciso promover a conscientização de professores, pais e alunos no sentido de que todos se unam no combate ao Bullying de forma a reparar os danos físicos e psicológicos causados pelos agressores aos agredidos, principalmente por meio da prevenção.
É a própria escola, por meio de um trabalho contínuo de formação de valores e atitudes morais, visando o desenvolvimento do respeito mútuo e tolerância à diversidade por meio da oferta de uma educação mais humana, formando indivíduos cada vez mais conscientes e autônomos. O andamento do processo letivo, precisa observar e promover ações que permitam a adaptação de todos ao meio educacional que permita a manutenção e o respeito à individualidade e às relações sociais.
Para Antunes e Zuin (2008, p. 76):
As práticas de violência na escola devem ser compreendidas por meio da análise social, das formas de organização e das forças objetivas da sociedade, e de como tais forças se materializam e se calcificam nos sujeitos que se desenvolvem nesse meio. Estudar a violência requer também este impulso crítico, tanto nas análises teóricas quanto na interpretação dos dados, de modo a mostrar múltiplas tensões e questionar o sentido social dos fenômenos singulares encontrados.


É evidente que qualquer forma de intervenção pode não atingir o seu objetivo, podendo ser até mesmo um fator instigante do processo reativo dos alunos, trazendo consigo reações negativas que acabam por gerar mais violência e agressividade. O ideal parece ser desenvolver uma estratégia de intervenção pautada no diálogo, dessa forma, as relações interpessoais se desenvolverão no âmbito da escola sem traumas, e com possibilidades de intermediação de conflitos sem que ocorra violência entre os alunos.
Relações interpessoais pautadas no diálogo se constituem através da interação com o outro e com o mundo, de forma a enriquecer o desenvolvimento pessoal e coletivo; tornando o ambiente da sala de aula em um local de felicidade e harmonia, que contribuirá, dessa forma, para a construção coletiva do respeito e do amor, dentro e fora do espaço escolar, ou seja, somente o diálogo pode minimizar os efeitos da violência no meio educacional, uma vez que este neutraliza as formas de expressão da violência na sala de aula, como o autoritarismo e a imposição de ideias.
Morais (1995, p. 78) acredita que:
A violência sempre deriva de um momento ou de um estado em que é impossível enxergar-se no semelhante. Daí termos presente que o fundamento do diálogo é a generosidade, tomada em sua origem etimológica: a capacidade de encontrar, no outro, alguém que como eu faz parte do gênero humano. Alguém de direitos e deveres, de alegrias e sofrimentos. Do gênero humano, mais do que simplesmente da espécie.

Dessa forma, acredita-se que a verdadeira educação para a cidadania está pautada no diálogo e na generosidade. O diálogo é substância construtora da paz, e como tal é o único mecanismo capaz de esvaziar a violência.
5 Considerações Finais
É preciso buscar uma solução conjunta para superar o Bullying na escola, com a participação dos gestores escolares, dos pais e dos próprios alunos, além e claro dos professores, na busca por soluções para a transformação as escolas em espaços de construção de respeito e cidadania, por meio de interrelações pautadas no diálogo e na garantia do exercício pleno da cidadania.
Nesse sentido, a construção de um projeto educativo a ser desenvolvido por meio do trabalho coletivo, com o intuito de superar o âmbito meramente burocrático dos projetos escolares para assumir um caráter prático e eficiente que atenda às necessidades da sociedade como um todo, evitando as transferências de responsabilidades e as sensações de impotência diante dos fatos apresentados. É preciso buscar uma solução coletiva para as questões de violência e indisciplina, afinal, a escola precisa ser um ambiente seguro no qual as pessoas se sintam livres para exercer seu direito à aprendizagem.
Durante muitos anos, apesar dos discursos, a educação brasileira pouco se atentou para as questões de formação de cidadania. Ainda hoje, pouco se faz no sentido de orientar os adolescentes e jovens na construção de conhecimentos a cerca do assunto de forma a garantir a sua formação integral, no sentido de exercerem sua cidadania de maneira efetiva e concreta.
Os educadores precisam adotar um papel de mediadores estrategistas no sentido de identificar as causas prováveis da prática do Bullying na escola, e promover a busca da dignidade que possa transformar o ambiente escolar novamente num espaço de integração e respeito e valorização da vida.
6 Referências
ABRAMOVAY, Miriam. Violência nas escolas: versão resumida. Brasília: UNESCO / REDE PITÁGORAS. 2003.
ANTUNES, Déborah C.; ZUIN Antonio A.S. Do Bullying ao Preconceito: Os Desafios da Barbárie à Educação. Psicologia e Sociedade. V. 20, 2008.
COLOMBIER, Claire. A violência nas escolas. São Paulo: Summus, 1989.
GIGLIO, Célia M. Benedicto. A violência escolar e o lugar da autoridade. In: Autoridade e autonomia na escola. Julio Groppa Aquino (Org). São Paulo: Summus, 1999.
LOPES NETO, A.A. Bullying – Comportamento Agressivo Entre Estudantes. Jornal de Pediatria, Rio de Janeiro: 2005.
MORAIS, Regis de. Violência e educação. Campinas: Papirus, 1995.
RISPOLI, Reginaldo. Lazer na escola, forte aliado no combate à violência. Brasília: UNESCO, 2000.
SCHELB, Guilherme Zanina. Violência e criminalidade infanto-juvenil: intervenções e encaminhamentos. Brasília: [ed. do autor], 2004.
SHILLING, Flavia. A Sociedade da Insegurança e a Violência na Escola. São Paulo: Moderna, 2004.

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